terça-feira, 3 de julho de 2012

Conceição Silva


Campo Belo, MG (1938)
Vive em São Paulo - SP


Iemanjá


O amor ao detalhe
Por Oscar D’Ambrosio


Há pintores autodidatas que fascinam pelos temas, voltados para o folclore. Outros se valem de mergulhos imaginativos em atmosferas fantásticas, de sonho. Há ainda os que se destacam pelo colorido surpreendente.


No caso da pintora Conceição Silva, seu principal atributo é o amor ao detalhe, em uma busca consciente e incessante por não deixar espaços da tela sem imagens.



Oriunda de uma família de artistas, Conceição nasceu em Campo Belo, MG, em 27 de setembro de 1938, mas foi registrada apenas em 7 de outubro.

Migrou ainda menina, com a mãe e os irmãos, para São Paulo, SP, onde exerceu diversas profissões humildes para sobreviver, pois, até então, a arte nunca fora vista como uma atividade lucrativa, capaz de assegurar o seu sustento.


Conceição começou a pintar em 1962, mas somente passou a expor seus trabalhos dois anos depois, no Embu das Artes. A aproximação ocorreu por acaso, quando seu irmão Vicente, escultor, começou a namorar Raquel, filha do poeta Solano Trindade, grande incentivador das artes naquele município.

Dado o primeiro passo, ela passou a participar de eventos culturais nacionais e internacionais, sendo que alguns de sus quadros estão no Exterior.






Conceição lembra que seus primeiros quadros mostravam cenas mais cômicas. Era o início de uma série de pinturas sobre variados temas.

Há 30 anos, ela expõe seus trabalhos na Praça da República, em SP, junto com a família. Mãe de cinco filhos e avó de seis netos, encontra tempo para prosseguir com a carreira com imagens de cores intensas e grupos humanos geralmente vibrantes, em atividades como danças ou festas.


Baianas na Cachoeira

Na Bienal Naïfs do Brasil de 1998, realizada em Piracicaba, SP, Conceição obteve classificação com duas telas. Roda de capoeira apresenta grande profusão de imagens e coloridos vestidos de baiana, pintados com todas suas rendas e intensas variedades cromáticas, enquanto Rosas do campo, tela mais próxima ao universo naïf pela desproporção entre o tamanho das crianças e o dos adultos, mostra, em primeiro plano, mulheres de vestido rosa e, mais atrás, um casal apaixonado de noivos, todos situados em meio a um colorido roseiral.

Na Bienal seguinte, a artista também classificou dois trabalhos. Minha mensagem é um conjunto de imagens bem presente no universo pictórico de Conceição: o de uma paisagem rural próxima à água. As roupas coloridas das mulheres, as manchas dos carneiros e o céu repleto de nuvens e pássaros compõem um conjunto equilibrado e uniforme.


Frevo

Entre as duas mulheres no primeiro plano, surge um pavão, com corpo azul e uma cauda aberta em azul e dourado, que se relaciona cromaticamente com as saias rosa e azul, da mulher da esquerda; e verde, amarelo e vermelho, da mulher da direita. Tudo isso é ainda matizado pelas crianças brincando na água azul da parte inferior esquerda do quadro.

Outra tela apresentada nessa mostra foi Dança do café, no qual novamente se destacam as roupas coloridas das mulheres, mostradas em movimentos compassados, enquanto um percussionista é apresentado de camisa amarela ao lado de um pé de café. Mais uma vez, as nuvens e pássaros estão presentes para não deixar espaços em branco na tela.

Um quadro que ilustra bem a facilidade de Conceição ao lidar com o espaço da tela é Baiana e São Francisco Na parede, no canto direito da tela, há um quadro do santo, rodeado por pássaros e caminhando numa estrada de terra, ladeada por flores rosas. Olhando para o observador, ocupando toda a lateral esquerda, surge, imponente, uma baiana, com turbante, colar, enormes brincos e um pássaro tropical em cada mão.

Na parte inferior direita, há ainda uma criança mulata, que oferece, com a mão direita, comida a um terceiro pássaro, junto ao vestido da baiana. O menino também carrega um pássaro na sua mão esquerda, contribuindo, portanto, para o estabelecimento de um complexo universo de relações entre a baiana, a criança e o quadro do santo na parede.
A baiana, que dialoga com São Francisco, está em contato com os pássaros e a criança. O conjunto sugere que o santo, a mulher e a criança talvez sejam justamente aqueles que possam ter uma relação mais direta com a natureza e, por conseqüência, com Deus.

Esse tipo de leitura simbólica também pode ser realizado na obra mais importante da artista, um painel pintado para a Mercearia do Conde, em São Paulo, SP, na rua Joaquim Antunes, 217. Diversas cenas, típicas do interior do Brasil, são justapostas numa composição exemplar, que reserva, em sua parte inferior, espaço para uma região coberta de água, na qual um dos personagens mergulha, com naturalidade e displicência, os pés, já que aquela natureza é, para ele, farta e integra o seu cotidiano. O ludismo do quadro fascina, não só pela intensidade das cores, mas pela riqueza dos detalhes, que convidam a renovadas leituras.

Trabalhando sem esboços, criando suas imagens diretamente na tela, Conceição, que gosta de mostrar grávidas, pinta tanto brancos e negros, geralmente numa mesma tela. A artista encanta pelo poder de criar cenas alegres repletas de figuras humanas e da natureza, que se articulam em composições espontaneamente equilibradas. Todo espaço é aproveitado no sentido de compor um todo harmônico, fundamentado no princípio de que cada detalhe contribui decisivamente para criar, com cores fortes e traços bem definidos, cenas que transmitem alegria de viver.

Fonte: www.artcanal.com.br/oscardambrosio


Festa Junina



Um comentário:

  1. Estou feliz por ter encontrado Conceição. Tenho muitos quadros dela, comprava sempre na praça da República, quando ia ao Brasil. Vejo que este texto publicado tem dez anos. Gostaria de saber se ela é viva. Teria um grande prazer em reencontrá-la. Rui Martins, jornalista.Do Olhar Crítico do Rui Martins, Youtube.

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